Política defensiva da jurisprudência

Referente ao tema, política defensiva da jurisprudência, é de suma importância iniciar a discussão por afirmar que consiste em um grande problema do Poder Judiciário. Problema esse que se encontra presente significativamente no Superior Tribunal de Justiça e no Superior Tribunal Federal. Consiste em medidas que criam grandes obstáculos nos requisitos de admissibilidade na interposição de recursos. Entretanto, o Novo Código de Processo Civil de 2015, buscou resolver de forma mais sucinta esses vícios que causam transtornos aos jurisdicionados, portanto tomou como pilar fundamental superar a política defensiva da jurisprudência tratando em seu texto novas possibilidades de saneamento desses vícios que constantemente eram motivo de inadmissibilidade recursal.

Antes do Novo Código de Processo Civil era notório, na maioria dos casos, a frequente preocupação de juízes com a questão processual, de forma que era de pouca análise as questões de direito material. Essa ocorrência é perceptível na ação da jurisdição de tomar para si a resolução de conflitos de forma privativa, dessa forma criou uma política defensiva perante ao jurisdicionado com a finalidade de diminuir a quantidade de recursos que recebia. A dificuldade que os tribunais superiores encaram, devido á grande demanda recursal para julgar, é possível comprovar-se por meio do discurso do Ex Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Humberto Gomes de Barros:

O STJ transformou-se em terceira instância. Passou a receber, indiscriminadamente, apelos oriundos de trinta e dois tribunais, espalhados por todo o Brasil. Os recursos que deveriam ser especiais transformaram-se em ordinários. Os 19.267 processos julgados em 1991 transformaram-se, em 2007, na inacreditável soma de 330.257 decisões. (BARROS, 2008)

Ao tratar dos processos que chegaram ao Tribunal afirma que receberam decisão padronizada e retornaram à origem ou, então, mergulharam no arquivo morto. Nesse sentido tratou:

Foram, simplesmente, moídos. Deles, não se retirou qualquer proveito. Ou, mais exatamente: deles aproveitaram-se as partes, que os manejaram apenas para retardar o cumprimento de suas obrigações. Lucrativa para o inadimplente, a proliferação de feitos é caríssima para o litigante vitorioso e para todos os contribuintes. (BARROS, 2008)

Humberto Gomes de Barros, afirma também, em seu discurso que o ato do Tribunal, de decidir não julgar o recurso é o mesmo de negar a jurisdição.

Percebe-se que devido a crescente grande demanda que os Supremos Tribunais recebem, a jurisdição passou a criar, como já citado anteriormente, obstáculos nos requisitos de admissibilidade recursal. Mas, apesar de essa medida ser favorável para os tribunais e parecer sanar o problema apresentado é extremamente maléfica para o jurisdicionado, uma vez que não faz coisa julgada e não dá a devida tutela do direito material violado. O jurisdicionado acaba sendo prejudicado por um problema que não é responsável. Alguns desses requisitos de admissibilidade recursal são; a exigência do número do processo de origem na guia de recolhimento das custas judiciárias; a impossibilidade de comprovação de feriado local após a interposição do recurso para os tribunais superiores; a intempestividade de recurso interposto antes da publicação em diário oficial do acórdão recorrido e o não conhecimento de recurso especial não ratificado após o julgamento de embargos de declaração da parte contrária.

O Novo Código de Processo Civil, na busca de superar essa política defensiva da jurisprudência dá prioridade á resolução do mérito no intuito de evitar a não resolução da lide, devido aos vícios no processo que foram citados anteriormente, visando a celeridade processual. Portanto, prevê o princípio da primazia da resolução do mérito, esse princípio aufere ao juiz a possibilidade de dar a parte a oportunidade de corrigir o vício do processo, dessa forma busca-se a resolução do mérito da causa. Esse princípio é favorável a parte recorrente, pois faz coisa julgada, evitando frustrações e perda de tempo. É presente em diversos artigos do Código a exemplo dos seguintes artigos, 4º e 6º (NCPC, 2015), respectivamente; \”As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.\”; \”Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.\”

Outra inovação trazida pelo Novo Código de Processo Civil foi a constitucionalização processual civil, harmonizando a lei processual à Constituição, ou seja, é como estudar o processo á luz dos princípios constitucionais. Visa observância aos seguintes princípios; devido processo legal, da ação e do impulso oficial, inafastabilidade, contraditório, duração razoável do processo, primazia do julgamento de mérito, boa-fé processual, cooperação, isonomia, entre outros. Essa implementação do modelo constitucional no Código é benéfica, pois traz justiça á decisão. De acordo com Donizetti:

O modelo constitucional do processo nada mais é, portanto, do que o resultado da interpretação das leis processuais a partir da necessidade de que o direito fundamental a um processo justo (tutela jurisdicional efetiva, célere e adequada) seja respeitado, consoante aos princípios e garantias constitucionais processuais. (DONIZETTI, p.30)

Diante de toda reforma realizada pelo Código de Processo Civil de 2015 as alterações que visão superar a política defensiva na jurisprudência estão contidas nos seguintes artigos (NCPC, 2015):

art. 76, § 2º – deixa claro que o regramento do art. 13 do atual CPC se aplica à instância recursal, de modo que, em caso de incapacidade processual ou irregularidade de representação da parte, deverá o relator possibilitar a correção do vício em prazo razoável, antes que não conheça do recurso ou determine o desentranhamento das contrarrazões;

art. 218, § 4º – estabelece a tempestividade do ato praticado (interposição de recurso, por exemplo) antes do termo inicial do prazo;

art. 218, § 4º – estabelece a tempestividade do ato praticado (interposição de recurso, por exemplo) antes do termo inicial do prazo;

art. 1020, § 2º – determina que o equívoco no preenchimento da guia de custas (como, por exemplo, a falta de referência ao número do processo na origem) não resultará na aplicação da pena de deserção, incumbindo ao relator, em caso de dúvida quanto ao recolhimento, intimar o recorrente para sanar o vício em cinco dias ou solicitar informações ao órgão arrecadador;

art. 1038 – admite o prequestionamento implícito ou virtual, no sentido de se considerar incluídos no acórdão recorrido, os elementos que o embargante pleiteou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade;

art. 1039, § 2º – afasta a necessidade de ratificação de recurso interposto anteriormente ao julgamento de embargos de declaração opostos pela parte contrária, desde que não se altere a conclusão do julgamento da decisão embargada;

art. 1042, § 3º – prevê que o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave (consunção processual), dispositivo este que, evidentemente, dependerá da conformação mais ou menos formalista da jurisprudência dos tribunais superiores;

art. 1045 – permite o aproveitamento do recurso especial e sua conversão em extraordinário, caso se considere que a insurgência versa sobre questão constitucional;

art. 1046 – permite o aproveitamento do recurso extraordinário e sua conversão em especial para o Superior Tribunal de Justiça, caso o Supremo Tribunal Federal considere como reflexa a ofensa à Constituição nele veiculada, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado.

Entende-se, portanto que aos tribunais superiores a criação de precedentes de decisão com a finalidade de evitar o julgamento dos recursos, devido a grande demanda recursal, consiste em uma política defensiva da jurisprudência. Define-se por “política”, pois essa medida jurisdicional não é prevista legalmente. Nesse sentido, a finalidade do Novo Código de Processo Civil, ao buscar superar a política defensiva da jurisprudência, por meio dos já citados meios, é benéfica, tendo tem vista que garante a celeridade processual, cumpre com a garantia de que a jurisdição só pode ser negada por meio de pressupostos constitucionais e pressupostos processuais e evita que o Tribunal deixe de julgar questões que possivelmente tenham caráter relevante. Insta salientar que também não é permitido mais, á luz do novo Código, o injusto prejuízo ao jurisdicionado que antes não adquiria solução para sua lide.

 

REFERÊNCIAS

DONIZETTI, Elpidio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. Revisada e São Paulo: Atlas, 2016.

BARROS, Humberto, Discurso de posse de presidência do Supremo Tribunal de Justiça, 2008.

NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, CPC 2015, artigos 4; 6; 76, § 2º; 218, § 4º; 1020, § 2º; 1038; 1039, § 2º; 1042, § 3º; 1045; 1046.

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